Lições chilenas para o Brasil-2010 Imprimir
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Sábado, 23 de Enero de 2010 13:20

Por CLÓVIS ROSSI

Lição número 1 (extraída do noticiário de ontem do jornal espanhol "El País"):

Eduardo Frei, o candidato da coalizão ora no governo (a "Concertación"), demorou apenas 30 segundos em seu discurso para felicitar o ganhador das eleições de domingo, o direitista e opositor Sebastián Piñera.

Já avançada a noite eleitoral, entrada a segunda-feira, o derrotado pegou a família, foi até o hotel em que o adversário festejava a vitória para cumprimentá-lo ao vivo e em cores --e diante das câmeras de TV que transmitiam os eventos da eleição de domingo.

Também ao vivo e em cores, a presidente Michelle Bachelet, derrotada embora extremamente popular, pegou o telefone, ligou para Piñera para cumprimentá-lo e dizer: "Espero que o Chile possa seguir pela trilha do progresso".

Piñera agradeceu e aproveitou para solicitar um favor: "Quero pedir seu conselho e ajuda para poder continuar seu trabalho porque sua experiência no governo é muito importante".

Bachelet topou na hora e avisou que, no dia seguinte, iria, a presidente em pessoa, à casa do ganhador para conversar. O incrível é que foi mesmo hoje, segunda-feira.

Tem mais: a mulher de Piñera também fez questão de tomar o telefone --sempre diante de câmeras e microfones-- para dizer a Bachelet: "Señora presidenta, quero dizer que, como mulher, me sinto orgulhosa de que a senhora tenha sido a presidente de todos os chilenos".

Se você viu ou ouviu algo semelhante no Brasil, me conte por favor porque minha memória, mesmo muito longa, não registrou nada parecido.

Lição número 2

A presidente Bachelet, filha de um militar morto sob tortura pela ditadura do general Augusto Pinochet, inaugurou faz pouco o Museu da Memória e dos Direitos Humanos.

O lema do novo museu é simples: "Não podemos mudar nosso passado. Só nos resta aprender do que vivemos. Esse é nosso desafio".

Enquanto isso no Brasil, nem o governo constrói um museu parecido, embora aqui também tenha havido violação em larga escala dos direitos humanos, nem se anima a "aprender do passado", que nem torturadores nem torturados podem mudar. Mas podem --e deveriam-- contá-lo na íntegra.


Clóvis Rossi é repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha, ganhador dos prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Assina coluna às quintas e domingos na página 2 da Folha e, aos sábados, no caderno Mundo. É autor, entre outras obras, de "Enviado Especial: 25 Anos ao Redor do Mundo e "O Que é Jornalismo".

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Última actualización el Sábado, 23 de Enero de 2010 13:22