O Princípio de Peter e o Brasil (I) Imprimir
Escrito por Fuente indicada en la materia   
Jueves, 14 de Enero de 2010 17:35

Por MIGUEL CABEZAS (Netmind)

Um dos princípios mais curiosos e polêmicos da administração é o denominado Princípio de Peter, formulado por Laurence Johnston Peter (1919–1990), antigo professor na University of Southern Californiae na University of British Columbia. O Princípio de Peter tornou-se famoso com a publicação da obra homônima, de 1969, hoje considerada como um clássico na área de gestão empresarial.

 

Num sistema hierárquico, todo funcionário tende a ser promovido até o seu nível de incompetência.(Do original, em língua inglesa: ”In a hierarchy, every employee tends to rise to his level of incompetence“. Fonte: Wikipedia)

 

Como o próprio artigo da Wikipedia aponta, o princípio só faz sentido em organizações meritocráticas. Deste “axioma” fundamental é que emana toda a cultura Dilbert nos EUA. Este princípio, pois, é muito conhecido em países com culturas mais ou menos meritocráticas.

 

Eu acredito que nenhum pais seja completamente meritocrático, porém, um grau mínimo de meritocracia é necessário para fazer a máquina burocrática  ”funcionar” de forma aceitável. O Princípio de Peter estabelece que a pessoa vai sendo promovida de posições nas quais é eficiente e eficaz, até chegar a uma posição hierárquica mais ou menos alta na qual a sua eficiência e eficácia deixam muito a desejar, ou seja, a pessoa passa a ser incompetente.

 

Para evitar rir do “traje invisível do imperador”, os países de cultura meritocrática, principalmente os anglo saxões, descobriram uma estratégia de “camuflagem da incompetência” infalível: a excentricidade. Nesse sentido, a proverbial fleuma britânica provê um arcabouço inigualável para performances espetaculares. ”Fulano é excêntrico” é sinônimo de uma alta posição social e de respeito, mesmo que seja um completo incompetente. O problema desta solução é que depende muito do estilo e do caráter da pessoa, daí a importância da fleuma, já que a excentricidade mal executada cai no ridículo.

Excêntrico ou Ridículo? Foto Flickr

No Brasil, para evitar esse risco, a estratégia adotada é outra. Consiste em uma pose exagerada, um ríctus de seriedade quase pétreo. Eu, particularmente, tive várias experiências com gestores totalmente incompetentes. Quando você falava com eles, parecia mesmo que eram membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Isto também pode beirar ao ridículo, porém, para muitos brasileiros ainda não “caiu a ficha” e acreditam na “respeitabilidade” da pessoa em questão. Aqui ainda não aprenderam que o hábito não faz o monge.

 

Como o grau de autoridade atingido pela pessoa é paralelo ao seu grau de “certeza” (este é outro principio da “administração” que encontra o seu paradigma máximo no Papa), ninguém ousa discutir com essa pessoa as decisões ruins que toma. Portanto, as possibilidades dos incompetentes das altas hierarquias perderem o seu cargo (uma “despromoção”), são bastante remotas, podendo ocorrer só mesmo com a falência da empresa, organização ou país (como no caso de Hitler).

 

Mas o Princípio de Peter, exposto pelo seu autor em tom de fino humor (sem dúvida, uma herança inglesa de Laurence), é questionável, não por ser falso, como alguns afirmam cinicamente, mas porque todo princípio tem exceção:

 

Nem todos os que são promovidos atingem o seu nível de incompetência. Alguns respondem adequadamente e com competência às novas responsabilidades. Esta é a explicação de porque algumas empresas são bem sucedidas, mesmo em ambientes de alta concorrência. A resposta é que há pessoas realmente inteligentes no comando.

 

Eu, sinceramente, gostaria que o Brasil fosse um país meritocrático, onde “sofrêssemos” a problemática do princípio de Peter. Porém, o que se verifica aqui no país do “faz de conta” é uma versão oposta e mais simples desse princípio, que vou autodenominar de “Princípio de Miguel”. Reza mais ou menos assim.

 

Num sistema não hierárquico, todo funcionário competente tende a ocupar o menor nível de responsabilidade possível.

 

Isto é, num pais como o Brasil, as pessoas inteligentes e competentes ocupam os cargos de responsabilidade de menor hierarquia possível, enquanto os postos de maior responsabilidade são escolhidos arbitrariamente. Ou seja, não existe a progressão de Peter, simplesmente os cargos de alta responsabilidade são indicados a dedo (o famoso QI).

 

Claro que entre tanta indicação a dedo pode existir alguém competente (uma raridade, mas ocorre), porém, deve ser estatisticamente demonstrável que as exceções ao meu princípio são muito menores que as de Peter. Fica lançada aqui a idéia para que alguém desenvolva uma tese comparando os dois princípios.

 

O “Princípio de Miguel” explica o por quê da precária situação de tantas e tantas cidades no Brasil; o mau funcionamento das instituições no geral; e o sofrimento do povo brasileiro. Em poucas palavras, as pessoas certas não estão nos cargos certos, ou, as pessoas erradas estão em postos de responsabilidade que não deveriam ocupar, principalmente na máquina pública.

 

Deixo para um segundo momento a análise das razões culturais desta situação no Brasil e uma interessante relação do Princípio de Peter com a atual crise econômica.

 

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