Que fizeste quando vieram buscar o inconformado? Imprimir
Escrito por Fuente indicada en la materia   
Martes, 29 de Diciembre de 2009 20:37

Por Yoani Sánchez

Minha predisposição para respeitar as diferenças foi posta à prova com a “Carta em repúdio as atuais obstruções e proibições de iniciativas sociais e culturais“. Recebido através do correio eletrônico, o texto congrega a voz desencantada e oprimida de um grupo de intelectuais e acadêmicos.Entre eles descubro alguns dos nomes que no longínquo 2007, com certa ingenuidade, contribuiram para erguer o mito das reformas raulistas. Nessa época falavam de medidas por implementar, de ajustes e transformações - mais estéticos do que sistêmicos - que deveriam ser aplicados. Dois anos depois parecem tremendamente alarmados pelo rumo que o país tomou. Com seus artigos sinalizaram a hipótese de que o processo cubano poderia reinventar-se a si mesmo, como se este absurdo em que vivemos fosse um roteito escrito pela maioria e não a rígida pauta que sai de um escritório somente.

Não serei eu a culpar outrens porque demoraram demasiadamente em se pronunciarem. Eu, que calei-me durante quase trinta anos, não tenho o direito de julgar quem portou a máscara do conformismo, o rosto passivo de quem não quis se meter em problemas. Celebro qualquer inciativa que traga à luz esse rio de críticas que tem estado represado nas cavernas de nosso medo durante várias décadas. Estenderei então a minha mão - sem fazer reprovações - aos que assumirem o risco de se expressarem, porque assim diminuirá neles o temor de passar do aplauso mecânico à crítica aberta.

A carta expõe várias lacunas, especialmente na lista dos fatos que provam o “ïncremento do controle burocrático-autoritário”. Faltam nessa relação os amargos acontecimentos de 10 de dezembro passado, o aumento dos chamados comícios de repúdio, os fustigamentos contra vários opositores e o emprego da violência física contra muitos deles. Uma menção especial merece a utilização que se faz do termo “contrarrevolução”, com os usuários assumindo essa linguagem degradante e excludente que brota das tribunas. Surpreeende ver professores, economistas e universitários graduados classificando com tanto esquematismo os seus concidadãos. Assusta-me essa sociedade que intuo neste documento, onde poder-se-á falar abertamente de trotskismo, anarquismo ou socialismo, continuando amordaçados os social-democratas, os democratas cristãos e os liberais. Se a proposta é essa, sinto muito, porém esse não é o país onde quero que meus netos cresçam.

Não creio que vivamos um re-pavonização, porque no fim das contas o rígido Luis Pavón não teve poder para lançar à rua uma turba que gritava e golpeava; tãopouco seu poder chegava para condenar à penas de até trinta anos nenhuma pessoa. Os nebulosos censores daquele quinquenio cinzento careciam de autoridade para manterem um cerco de vigilância ao redor de uma casa, escutarem uma linha telefônica ou prender - sem levar à uma delegacia de polícia - um jornalista independente ou um blogueiro. Não é um retorno dos inquisidores da cultura o que estamos vivendo, senão o aperto do parafuso de um sistema agonizante e carente de argumentos, a queda do último véu que deixou a descoberto o rosto feio do autoritarismo.

O título é uma referência a frase de Niemöller citada na Carta: “Quando vieram buscando os judeus, eu calei pois não era judeu; quando vieram buscando os comunistas, eu calei pois não era comunista; quando vieram buscando os sindicalistas, eu calei pois não era sindicalista; depois vieram me buscar, e ninguém falou”. Para contextualizar esta ideia eu gostaria de perguntar aos signatários do documento se calar-se-ão quando vierem buscar um “contrarrevolucionário”, um “gusano”, um “opositor”, se eles estarão entre os que golpeiam nos comícios de repúdio ou entre os que defendem a vítima.

Traduzido por Humberto Sisley de Souza Neto

Última actualización el Martes, 29 de Diciembre de 2009 20:39