Declarações de Lula à RTP sobre "mensalão" inflamam Supremo brasileiro Imprimir
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Martes, 29 de Abril de 2014 08:57

Ao defender, em entrevista à RTP, que houve “80 por cento de decisão política” no desfecho do caso conhecido como mensalão, o antigo Presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva reacendeu uma controvérsia cujos ecos chegaram já ao Supremo Tribunal Federal daquele país.

Declarações de Lula à RTP sobre mensalão inflamam Supremo brasileiro

Numa nota de Joaquim Barbosa, presidente do órgão judicial que condenou 25 dos 38 réus no processo do esquema de compra de votos, conclui-se que “o juízo de valor emitido pelo ex-Chefe de Estado não encontra qualquer respaldo na realidade” e demonstra uma “dificuldade em compreender” uma Justiça independente.

“O juízo de valor emitido pelo ex-Chefe de Estado não encontra qualquer respaldo na realidade e revela pura e simplesmente sua dificuldade em compreender o extraordinário papel reservado a um Judiciário independente em uma democracia verdadeiramente digna desse nome”, reagiu o presidente do Supremo Tribunal Federal do Brasil, em comunicado difundido nas últimas horas pela generalidade da imprensa do país.

Em causa estão afirmações de Lula da Silva sobre o processo mensalão proferidas na entrevista conduzida pela jornalista da RTP Cristina Esteves e emitida no passado sábado. Sustentava então o antigo Presidente brasileiro que o julgamento teria conhecido um desfecho de pendor essencialmente político.
O caso mensalão eclodiu em 2005, durante a Presidência de Lula da Silva, e envolveu figuras próximas do antigo número um do Partido dos Trabalhadores. Incluindo José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil. O esquema de corrupção julgado em Brasília pelo Supremo Tribunal Federal consistia no pagamento de subornos mensais a deputados e dirigentes do PT em troca de votos parlamentares.

Com mais de 600 testemunhas, três centenas de volumes com 50 mil páginas, 53 sessões e 38 réus, o julgamento assumiu uma dimensão histórica. No final, o Supremo condenou 25 réus, entre os quais José Dirceu, por corrupção e formação de quadrilha criminosa.

“Tem uma coisa que as pessoas precisam compreender: o povo é mais esperto do que algumas pessoas imaginam”, atalhou Lula da Silva, para propugnar que, nas sentenças do Supremo Tribunal Federal, houve “praticamente 80 por cento de decisão política e 20 por cento de decisão jurídica”.

“O que eu acho é que não houve mensalão. Agora, eu também não vou ficar discutindo as decisões da Suprema Corte. O que eu acho é que essa história vai ser recontada, é apenas uma questão de tempo”, insistiu Lula, depois de recordar ter indicado para o Supremo Tribunal seis dos 11 ministros (designação brasileira) que julgaram o processo.

Para o presidente do Supremo Tribunal Federal, estas palavras de Luiz Inácio Lula da Silva acabaram por minar ainda mais a confiança dos cidadãos brasileiros nas instâncias judiciais.

“Lamento profundamente que um ex-Presidente da República tenha escolhido um órgão da imprensa estrangeira para questionar a lisura do trabalho realizado pelos membros da mais alta Corte da Justiça do País. A desqualificação do Supremo Tribunal Federal, pilar essencial da democracia brasileira, é um fato grave que merece o mais veemente repúdio. Essa iniciativa emite um sinal de desesperança para o cidadão comum, já indignado com a corrupção e a impunidade, e acuado pela violência. Os cidadãos brasileiros clamam por justiça”, reprova Joaquim Barbosa.
“Um massacre”

Na mesma entrevista à estação pública, Lula foi mesmo ao ponto de descrever o processo como “um massacre que visava destruir o PT”.

Confrontado com os sucessivos escândalos com epicentro no Partido dos Trabalhadores, o antigo Presidente brasileiro retorquiu: “Não adianta dizer que o Lula pratica qualquer ato ilícito porque o povo me conhece. Eu sou filho de pai e mão analfabetos e digo todo o dia para não ter dúvidas. O único património que minha mãe me deixou foi a conquista de andar de cabeça erguida”.

O presidente do Supremo Tribunal Federal contrapõe que o processo decorreu com transparência, dado que réus e Ministério Público tiveram acesso simultâneo aos autos a partir de qualquer região do Brasil.

“Os advogados dos réus acompanharam, desde o primeiro dia, todos os passos do andamento do processo e puderam requerer todas as diligências e provas indispensáveis ao exercício do direito de defesa”, acentua o responsável.

Joaquim Barbosa sublinha ainda que defesa e acusação tiveram mais de quatro anos para produzir prova. E que foram ouvidas mais de seis centenas de testemunhas e realizadas perícias por diferentes entidades, algumas das quais “situadas na esfera de mando e influência do Presidente da República” – são citados o Banco Central, o Banco do Brasil e a Polícia Federal, além do Tribunal de Contas da União e a própria Câmara dos Deputados.

RPT

Última actualización el Jueves, 01 de Mayo de 2014 00:43