Os crimes (ocultos) da guerrilha na Guatemala Imprimir
Escrito por Indicado en la materia   
Lunes, 13 de Mayo de 2013 08:40


GUATEMALA-JUSTICE-HUMAN RIGTHS-RIOS MONTT

A sentença de 80 anos de prisão para Efraín Rios Montt conta apenas com 50% da verdade neste país centro-americano. O Estado guatemalteco, durante o regime liderado pelos militares (1963-86), cometeu excessos e amparou massacres que tiveram sua contraparte, quase sempre esquecida, nas matanças cometidas pela guerrilha.

(Especial para Infolatam por Rogelio Núñez)- Não importa se houve 250 mil mortos (como sustenta a guerrilha e a “história oficial”) ou se foram em torno de 37 mil, como asseguram estudos acadêmicos como o de Carlos Sabino, o que está claro é que houve mortes, atentados, excessos e massacres por ambas as partes.

Os crimes da guerrilha

Por exemplo, neste mesmo mês de maio foi preso na capital Fermín Solano Barillas, que durante a guerra utilizou o pseudônimo de “Subteniente David”. Pertencia à Organização Revolucionária do Povo em Armas (ORPA), um dos quatro agrupamentos que integraram a guerrilheira Unidade Revolucionária Nacional Guatemalteca (URNG).

 

Efraín Rios Montt foi presidente depois do golpe de estado de 1982

Consideram-no vinculado ao denominado “masacre de El Aguacate”, perpetrado no dia 24 de novembro de 1988 por uma dezena de guerrilheiros da “frente Javier Tambriz” da ORPA.

Ao comando do “Subteniente David” assassinaram 21 camponeses da aldeia El Aguacate, no departamento de Chimaltenango, segundo a acusação.

Um dia antes, o mesmo grupo guerrilheiro assassinou um “comissionado militar”, como se chamava então aos civis que colaboravam com o Exército, quem supostamente tinha descoberto um esconderijo com armas.

Os antigos comandantes da ORPA reconheceram sua responsabilidade nessa matança ante a Comissão para o Esclarecimento Histórico das Nações Unidas, que na década de 1990 investigou as violações aos direitos humanos cometidas durante a guerra.

A denúncia por essa matança, a primeira que prospera contra um antigo grupo guerrilheiro, foi apresentada ante a Promotoria em fevereiro do ano passado pelo humanitário Grupo de Apoio Mútuo (GAM), que considera responsáveis três ex-comandantes rebeldes.

Que a guerrilha cometeu crimes é algo que a ninguém duvida na Guatemala, que se desconhece no resto do mundo e que no país centro-americano se costuma esconder.

 

A guerrrilha guatemalteca nos anos 80

Nos anos 90, a famosa revista Crónica, que agora pode ser acessada inteira em um site criado pela Universidad Francisco Marroquín, intitulava um de seus números, de agosto de 1997, “Os Crimes da Guerrilha“.

A revista, dirigida por Francisco Pérez de Antón, recordava então, a um ano da assinatura dos acordos de paz de 1996, como a guerrilha teria participado, tirando por baixo, em 6 matanças com mais de 250 pessoas assassinadas.

Ocorreu, por exemplo, em Barillas (Huehuetenango em 1980), nas aldeias de Calapté, Chacalté e na de Salacuín em 1982,  além da do Aguacate em 1989.

Como recorda Raúl Figueroa Sarti em seu blog: “levando em conta todos os antecedentes da investigação, a CEH chegou à plena conclusão de que 55 pessoas civis e indefesas, entre mulheres, idosos e crianças da comunidade de Chacalté, foram executadas arbitrariamente por membros do EGP pertencentes à Frente Ho Chi Minh. Este massacre constitui uma grave violação aos princípios comuns do Direito Internacional dos Direitos Humanos e do Direito Internacional Humanitário”.

Atentados e sequestros

 

Assassinato de John Gordon Mein, embaixador do Reino Unido

Ainda assim, desde os anos 70, a guerrilha respondeu à repressão estatal com atos terroristas (desde assassinatos como o do dirigente Mario López Villatoro, em 1969, ao do empresário Alberto Habie, em 1980, ou Alicia Chinchilla, em 1992).

Por conseguinte, é evidente que “durante 36 anos -como assegurava a revista Crónica em 1997- os civis foram as principais vítimas do Exército e das organizações que integraram a Unidade Revolucionária Nacional Guatemalteca”.

Assim mesmo, as diferentes facções da URNG foram ao sequestro para financiar-se e provocar terror.

Cerca de 68 pessoas teriam sido “plagiadas” nos anos de conflito interno, entre os anos 60 e 1996. Quatro desses sequestros acabaram em assassinatos, como foram os casos de Luis Ibargüen e Luis Canella, importantes empresários guatemaltecos.

Igualmente, foram assassinados o embaixador dos EUA, John Gordon Mein, e o da Alemanha, Karl von Spreti, em 1968.

Como recordou há alguns anos Danilo Parrinello, no jornal El Periódico, “o embaixador alemão que apresentava um tiro na cabeça. Esta execução arbitrária foi perpetrada pelos membros das FAR .“Nenhuma circunstância outorga justificativa jurídica ou ética a este crime” (Comissão para o Estabelecimento Histórico). “ A CEH considera que o fato ilustra a utilização que a guerrilha fez de pessoas inocentes, como o embaixador Von Spreti, a quem se converteu, desde o momento mesmo de seu sequestro, em vítima propiciatória de um jogo de medida de forças e políticas, com total desprezo ao direito à vida”.

E este autor conclui: “Agora eu me pergunto, o presidente Colom, tão propenso a pedir perdão e ressarcir economicamente, pedirá perdão à viúva e aos filhos do embaixador Von Spreti? Porque assassinaram terroristas. Escrevo isto pára que os jovens que só tiveram acesso a uma face da moeda saibam que houve crimes da guerrilha sem justificativa alguma”.

 

Karl von Spreti, diplomata sequestrado e assassinado pela guerrilha

Os sequestros continuaram até o final da guerrilha em 1996.

Juan José Cabrera, alias “Mincho”, um guerrilheiro guatemalteco da Organização do Povo em Armas (ORPA) participou do sequestro da idosa milionária Olga Novella, depois trocada pelo governo pelo comandante da ORPA “Isaías” (pseudônimo do médico Rafael Baldizón), libertado e expulso do país.

Alguns estão empenhados em contar a história da Guatemala em branco (a guerrilha) e preto (um estado dominado pelo exército que buscava exterminar os indígenas).

Para uns, como John Carlin no jornal El País, os maus estão apenas de um lado (“o álibi de Rios Montt evidentemente não teve muito impacto sobre o tribunal, que o condenou a passar os poucos anos de vida que lhe restam (tem 86) apodrecendo no cárcere. Eu comemoro isso. Como também celebrei que um dia depois de minha entrevista com ele, foi derrocado em outro golpe militar. A pena foi que os que o tiraram do poder foram, como Rios Montt e seus correligionários, outro grupo de palhaços assassinos”).

Mas, por desgraça, para os que não desejam fazer um esforço intelectual para entender a realidade, a História, e as histórias, são bem mais complexas. A divisão de bons e maus em 50% só ocorre nos filmes e na mentalidades dos que não traspassaram a infância intelectual.

Como a revista Crónica começava, em 1997, sua reportagem, não há que esquecer que, acima de tudo, “a guerra foi suja” e foi por ambas as partes.

Tomado de INFOLATAM

Traduzido por Infolatam