A visita de Yoani Sanches ao Brasil: falta de educação e subserviência Imprimir
Escrito por Indicado en la materia   
Sábado, 16 de Marzo de 2013 11:18

A blogueira, crítica do governo, Yoani Sánchez solicitou um novo passaporte e tendo-o recebido, decidiu fazer uma viagem de sete dias ao Brasil. Desde que lançou o blog “Generación Y”, em 2007, Yoani ganhou várias comendas: prêmio Ortega y Gasset do jornal espanhol “El País” (R$ 39,2 mil); prêmio do governo dinamarquês Príncipe Claus (R$ 100 mil); prêmio holandês Cepos (R$ 65 mil); prêmio Jaime Brunet da Universidade de Navarra (R$ 94,2 mil). Também ganhou menção honrosa na Maria Moors Cabot, da Universidade Columbia em Nova York (sem remuneração). (F S P, 21.02.2013, p. A-14).

Trata-se portanto de uma dissidente cubana de respeitabilidade internacional.

Por Edson Pereira

A vinda de Yoani ao Brasil não foi fácil. O regime cubano não permitia a saída da blogueira e o senador petista Eduardo Suplicy, sensibilizado com o trabalho dela, chegou a enviar uma carta à embaixada solicitando uma autorização especial para ela se ausentar do país.

Foi o bastante para transformar o senador em “inimigo da revolução” e por isso automaticamente promovido a agente da CIA. Ao se aliar à defesa de Yoani Sanchez, virou” persona non grata” do regime.

O embaixador cubano , Carlos Zamora Rodriguez  , segundo relato do senador Roberto Requião, do PMDB esbravejou ao receber a carta. “Como é que o PT permite isso? Esse senador é da CIA”. Eduardo Suplicy acusado de ser agente da CIA!!!!!! O senador tem uma história de atuação brilhante e essa acusação desconsidera a sua biografia .

Requião tentou sem sucesso promover a reconciliação entre o embaixador e o senador. Mas a revolta de Carlos Zamora foi parar na cúpula do PT, a quem ele se queixou formalmente da postura do senador, inclusive advertindo que o mau comportamento de Suplicy poderia comprometer a boa relação de Havana com o partido.

O PT não defendeu o senador e ao contrário, comprometeu-se a cerrar fileiras contra a visita da blogueira.  Suplicy tentou por meses, uma audiência com o embaixador, mas nunca conseguiu ser recebido. Com Yoani já no Brasil, também foi alvo da hostilidade de manifestantes, muitos deles petistas, que atacaram a blogueira cubana “Sempre defendi a democracia. Como diz a presidente Dilma, é melhor o barulho da liberdade de expressão, do que o silêncio da ditadura e, por isso, vou continuar defendendo a liberdade de expressão”. (Revista Veja, 27.02.2013, p. 55).

O governo cubano montou uma gigantesca operação para espionar a viagem e tentar desqualificar a blogueira.

Em seis de fevereiro, um grupo de militantes de esquerda, em sua maioria ligados ao PT, e também integrantes do PC do B e da CUT, foi chamado ao prédio da embaixada de Cuba em Brasília, para uma reunião com o embaixador Carlos Zamora Rodriguez.

O conselheiro político da embaixada, Rafael Hidalgo, no início do encontro falou que todos foram convocados de última hora, por telefone e não deveriam dizer os nomes, apenas as entidades e os partidos que representavam.

O embaixador entrou na sala e disse que todos estavam ali para ajudar o regime cubano a colocar nas ruas uma ofensiva de “contrainformação” para “desmascarar” Yoani Sanchez – “uma mercenária, financiada pelo governo dos Estados Unidos para trabalhar contra a Revolução Cubana, contra o povo, contra os trabalhadores”.

O diplomata distribuiu a todos um dossiê com 235 páginas, que reunia fotos pessoais de Yoani Sanchez, montagens e uma lista de seus prêmios internacionais, entre eles Ortega Y Gasset, da Espanha e o Príncipe Claus, da Holanda, ironicamente comendas concedidas apenas a destacados defensores da liberdade de expressão.  O dossiê é uma produção típica de ditaduras comunistas e relaciona coisas simples como comida, bebida e diversão, como se fossem artigos de luxo da “vida mercenária” da blogueira, que usaria sua luta pelas liberdades pessoais em Cuba, para ganhar dinheiro e, assim desfrutar mordomias impensáveis aos moradores da ilha como comprar uma lata de cerveja, um cacho de banana, ou ir à praia com amigos. Cada um dos presentes recebeu também um CD, com capas diferentes, provavelmente para identificar um eventual vazamento.

Os cubanos também disseram que vão seguir os passos da blogueira desde o instante em que ela pisar no Brasil, 24 horas, todos os dias.  Como o G2, serviço secreto cubano poderia fazer isso, atentando contra a soberania do Brasil é um mistério.

Um dos participantes do encontro, Ricardo Poppi Martins, é subordinado ao Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho e coordenador-geral de Novas Mídias do Ministério. Um dia após a reunião, ele viajou para Havana para participar de um encontro promovido pela ditadura cubana sobre técnicas de “ciberguerra” e” novas formas de comunicação de rede e batalhas políticas”.  (Revista Veja 20.02.2013, p. 58-63).

A participação de Ricardo Poppi Martins foi confirmada pelo governo em 18 de fevereiro, mas a Secretaria-Geral da Presidência afirmou que a participação se deu por coincidência, já que Ricardo estava na embaixada para retirar um visto. Quanto ao CD recebido, uma assessora informou que ele foi “destruído” com uma tesoura. (F S P, 20.02.2013, p. A-13).

Como é que um embaixador de um país estrangeiro se vê no direito de convocar militantes partidários de outro país e até um representante do gabinete da Presidência da República para a execução de uma estratégia de censura à visita de uma cidadã de seu país que vem ao território brasileiro pacificamente, com visto concedido pelo governo?

O embaixador cubano praticou um atentado à soberania nacional, feriu os mais elementares princípios das convenções diplomáticas internacionais e deveria no mínimo ter sido convocado pelo governo brasileiro para dar explicações sobre sua atitude, mas nada foi feito.

E a ação do embaixador foi seguida à risca pelos que participaram da reunião. Alimentados pelo dossiê distribuído pelo embaixador, os militantes do PT disseminaram na Internet a estratégia de combate à blogueira.

A “RedePT13”, uma organização virtual montada pelo partido que produz perfil falsos e blogs apócrifos usados para atacar aqueles que são considerados inimigos do partido. Se é preciso espalhar uma mentira para difamar alguém, a rede é acionada. . A rede foi criada por André Guimarães, funcionário do Congresso, lotado no gabinete do deputado André Vargas, atual vice-presidente da Câmara e secretário nacional de comunicação do PT. Portanto , dinheiro do contribuinte sustenta o funcionamento da rede. ( Revista Veja, 6.3.2013, p. 54-55) .

Especializados em perseguir e difamar adversários do partido, os seus membros são chamados de “militantes virtuais”, e integram uma massa invisível, composta de sites e perfis apócrifos na internet.

A rede entrou em ação contra Yoani Sanches. O falso dossiê foi replicado na rede que foi transformada em um braço digital da polícia política de Havana. (Revista Veja 27.02.2013, p. 52-58). Foram postadas montagens fotográficas, e incentivados protestos contra a cubana.

Qual foi a reação do governo brasileiro? Nenhuma. O chanceler Antonio Patriota se limitou a dizer que não havia tomado conhecimento da conspiração. O embaixador Carlos Zamora Rodriguez esteve no Palácio do Planalto em 21 de fevereiro, visitando Marco Aurélio Garcia, assessor de assuntos internacionais do governo e além de não receber nenhuma admoestação, saiu sorridente e despreocupado “Marco Aurélio é um amigo que estava enfermo”.

Ao silenciar sobre a hostilidade a Yoani, e pior, ao estimular e coordenar os atos de hostilidade ficou evidente para certas correntes petistas que a ditadura cubana é elogiável e não deve ser criticada e que a imprensa livre, é, em si, insuportável.

Não era o PT um dos partidos que mais combateu o regime militar? Como é que esse mesmo partido pode apoiar ardorosamente a ditadura cubana que aprisiona seus cidadãos há mais de cinquenta anos?

Conforme assinala João Pereira Coutinho, Cuba não são os Castro. “Cuba pertence aos cubanos, atraiçoados por Fidel em 1959. E o mais irônico é que as promessas do ditador eram outras: acabar com o ‘bordel’ de Fulgêncio Batista, realizar eleições livres no curso prazo e até, pasme-se, abrir a ilha ao mundo. Todos sabemos o resto da história, feito de fuzilamentos no ‘paredón’, presos políticos, restrição das mais básicas liberdades (como a de sair do país) e uma miséria material que os turistas ocidentais, em viagens quase zoológicas, toma por exótica. De fato, não há nada mais exótico do que visitar seres humanos em cativeiro... Economicamente Cuba falhou como falharam todas as experiências coletivistas da história. Com ou sem embargos”. ( F S P , 26.02.2013, p. E-10) .

Ditaduras como a cubana são muito eficientes para silenciar a oposição interna mediante férreo controle das comunicações e uso de grupos de repressão. A própria Yoani comentou isso em Feira de Santana “Um protesto assim contra um convidado do governo cubano não duraria mais do que dois minutos”. Porém querer continuar exercendo controle semelhante em território de outro país é surrealista.

Ao convocar simpatizantes brasileiros para reprimir Yoani, o embaixador cubano deu um tiro no próprio pé.

O que seria uma visita cordial, objeto de algumas linhas na imprensa e curtas chamadas na televisão, transformou-se em fenômeno da mídia. Todos os passos da blogueira passaram a ser acompanhados pela imprensa, sua visita ganhou destaque em manchetes e amplo espaço nos noticiários jornalísticos da televisão.

Ao obter sucesso em sua empreitada, todavia, o embaixador cubano acabou por demonstrar que o regime cubano tem fiéis seguidores no Brasil. Jovens radicais se apressaram a seguir suas ordens e se prontificaram a infernizar a visita de Yoani, cujo crime em Cuba como assinala a jornalista Eliane Catanhêde é “falar, escrever e discordar”.

Mais ainda, tamanha preocupação com uma blogueira que é pouco conhecida em Cuba devido ao controle dos meios de comunicação e a restrição à Internet, mostrou que a abertura do regime é mais limitada do que a propaganda oficial sugere. Ou seja, o regime se abre, mas desde que os que discordam continuem silenciados, o que é uma contradição por si só, pois a abertura pressupõe ampla liberdade de comunicação.

A VIAGEM

Yoani Sánchez embarcou em 17 de fevereiro em Havana, com destino ao Brasil depois de ter recebido nos últimos anos, mais de 20 recusas do governo para poder viajar ao exterior.  Ela afirmou “É uma vitória limitada, porque a reforma migratória de Cuba ainda não contempla a possibilidade de entrar e sair da ilha como um direito inerente ao mero fato de ter nascido neste país. Eu levo comigo a mensagem da esperança. Não sou ingênua. Sei que existem problemas, mas acredito no futuro e tenho muita esperança para o povo. Não tenho medo do meu retorno. Alguns amigos estão preocupados achando que eles [do governo] não me deixarão voltar, mas eu não acho que isso acontecerá porque seria uma violação grave da lei”.

Além do Brasil, a viagem incluía Alemanha, Espanha, Holanda, Itália, México, Peru, República Tcheca, Suécia e Suíça. (F S P, 18.02.2013, p. A-11)

Para a turnê por 11 países, Yoani declarou ter trazido o equivalente a R$ 400. (F S P, 21.02.2013, p. A-14).

CHEGADA A RECIFE

Em sua primeira escala no Brasil, em Recife, a recepção que Yoani teve,  mostrou que o pedido do embaixador cubano foi seguido à risca. Como se ela fosse uma terrorista chegando ao país, um punhado de manifestantes lhe atirou notas falsas de um dólar, um deles teria puxado seu cabelo longo.

Contardo Calligaris assinala que a alternativa “liberdade ou justiça” é tão falsa quanto” a bolsa ou a vida”, fazendo alusão a assaltos onde ainda existe esta alternativa.  O comentário justifica-se porque na chegada de Yoani ao Brasil, “houve pessoas, para ressuscitar essa falsa alternativa: como pode ela criticar a falta de liberdade em Cuba, quando o regime acabou com a fome na ilha? O fato é que para acabar com a fome na ilha, não era necessário acabar com nenhuma das liberdades dos cubanos... Em particular a troca da liberdade pela justiça produziu mundos sem liberdade (isso era previsto) e (isso não era) totalmente injustos, corrompidos por burocratas apenas interessados em se manter no poder”. (F S P, 28.02.2013, p. E-10).

Sobre estas manifestações ela afirmou “Foi um banho de democracia. Queria que em meu país pudéssemos expressar opiniões e propostas diferentes com esta liberdade”. (F S P, 24.02.2013, p. C-8).

SALVADOR

No aeroporto de Salvador, um grupo pequeno, mas intimidador obrigou aos gritos de “Cuba sim, ianques não”, a blogueira a deixar o local por uma saída alternativa. Caio Botelho, 25, diretor da União da Juventude Socialista, ligada ao PC do B, disse que o ato visava desmascarar a ativista, “paga pela CIA”.

FEIRA DE SANTANA

A hostilidade dos radicais contra uma simples blogueira visitando o Brasil não ficou apenas nas manifestações de protesto contra sua presença, estes sim uma demonstração patente de servilismo dos manifestantes ao governo cubano, mas dentro dos limites da democracia, foi muito mais além.

Em Feira de Santana (BA), ao invés de sentarem-se na plateia, assistirem ao filme e contra-argumentarem no debate, militantes do PT e do PC do B, impediram aos gritos a exibição de documentário, “Conexão Cuba Honduras”, do cineasta baiano Dado Galvão, do qual a blogueira participa.

Ou seja, para esses grupos, democracia significa impedir uma pessoa de fazer qualquer coisa, mesmo que seja assistir a um filme. Os radicais estão reproduzindo o Brasil às mesmas práticas da ditadura cubana para com o seu povo. Pergunta-se, será que é este modelo que querem para o Brasil. Como assinala Hélio Schwartsman “Se viver ali fosse bom, ou mesmo tolerável, o governo de Havana não teria passado mais de 50 anos impedindo viagens de cidadãos ao exterior. E não há sucessos na saúde e na educação que compensem a ausência de liberdades tão fundamentais como a de dizer o que pensa ou a de viver num outro país”. (F S P, 20.02.2013, p. A-2).

Yoani ironizou “Um protesto assim contra um convidado do governo cubano não duraria mais do que dois minutos.”. (F S P, 19.02.2013, p. A-14). Depois em São Paulo comentou “Impedir as pessoas de falar não é democracia, é fanatismo” (F S P, 22.02.2013, p. A-17).

Face ao aumento das agressões em Feira de Santana, dois seguranças privados se somaram aos dois já contratados pelos anfitriões (jornalistas e políticos locais) e, a pedido do prefeito José Ronaldo Carvalho (DEM), policiais militares passaram a acompanhá-la.

Na Câmara dos Dirigentes Lojistas da cidade, falou a jornalistas e disse acreditar que os protestos e o “ódio” de manifestantes pró-governo cubano, foram “motivados por terceiros. Desde que me deram o passaporte, nos sites oficiais começaram a me ameaçar, dizendo que chegando ao Brasil, teria uma resposta contundente”. Sánchez negou ser financiada por órgãos ou governos estrangeiros e atribuiu as acusações à irritação do governo com sua autonomia financeira como jornalista e escritora. (F S P, 20.02.2013, p. A-13).

BRASÍLIA

Em 20 de fevereiro, Yoani Sanchez visitou Brasília. A ida à capital foi definida na última hora, a partir de convite do PSDB. As passagens foram pagas pela Câmara, segundo o partido.

A entrada de Yoani na Câmara, no fim da manhã, interrompeu o debate que ocorria sobre a Medida Provisória que prevê desoneração na folha de pagamentos para vários setores.

Sua entrada causou tumulto pelos protestos de militantes que a acusavam de “mercenária” e “agente da CIA”, quanto pelos próprios parlamentares, que bateram boca na sua chegada, e pela aglomeração de jornalistas e seguranças em torno da cubana.

A deputada Erika Kokay (PT-DF), disse ao microfone “Essa Casa não deve repetir atitudes como essa”. Ao ouvir Erika, o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), sugerir que ela fosse a Cuba. A deputada reagiu, acompanhada de Ivan Valente (PSL-SP), que o chamou de “torturador”.

Em frente à sala onde ela era ouvida pelos parlamentares, havia oito ruidosos manifestantes. Pelo menos um deles era servidor da Câmara. Rodrigo Grassi, filiado ao PT, é secretário parlamentar da deputada Erika Kokay (PT-DF).  Ele chegou a gritar com os parlamentares, pedindo a liberação da entrada de manifestantes no plenário.

Requerimento solicitando segurança federal para Yoani entrou na pauta da Câmara, mas teve a aprovação impedida pelo PT e PMDB.

A jornalistas afirmou “um dos objetivos dessa viagem é recuperar parte desses prêmios [que ganhou nos últimos anos], com a intenção de levá-los a Cuba. Não sei como ainda, porque vai ser difícil entrar com ele. Quero utilizar isso como base principal para fundar meu jornal. Tenho a intenção de que esse seria o capital inicial”. A ideia com o jornal é, “testar os limites” da abertura e das reformas. Em Cuba, a maioria dos jornais, revistas e TVs são estatais. Na era Raúl, publicações ligadas à Igreja Católica, como a revista “Espacio Laical” e “Palabra Nueva”, se tornaram os principais veículos de debate sobre reformas com intelectuais de dentro e fora de Cuba. Em janeiro, o canal multiestatal Telesur, passou a transmitir ao vivo por 14 horas, a primeira emissora sem controle estatal cubano absoluto a fazê-lo. Mas o Telesur é de influência majoritariamente venezuelana. (F S P, 21.02.2013, p. A-14).

SÃO PAULO

Em São Paulo, na manhã do dia 21 de fevereiro, em conversa com jornalistas e leitores do jornal “O Estado de São Paulo”, Yoani cobrou do governo Dilma Rousseff um” posicionamento mais enérgico” e” duro” ao abordar o tema de direitos humanos.  “Tem faltado dureza ou franqueza na hora de falar do tema de direitos humanos na ilha. Tem havido silêncios demais. Os povos não esquecem”.

Sobre a repercussão de sua viagem feita ao Brasil afirmou “É a multiplicação por dez do que eu esperava”.

Mais tarde, Sánchez compareceu ao Cine Livraria Cultura, na Av. Paulista e pode assistir a mais um episódio de grosseria e fanatismo. Manifestantes da UJS (União da Juventude Socialista), do Partido Comunista Revolucionário e de outras organizações , aos gritos, o grupo, regularmente inscrito para participar do evento, impediu que parte das respostas da blogueira fosse ouvidas. É essa a democracia que esses radicais querem, igual a Cuba, a democracia do silencia, onde só um lado fala. A agressividade obrigou ao encerramento antecipado da apresentação e ao cancelamento da sessão de autógrafos de seu livro “De Cuba, com Carinho”.

André Tokarski, 29 anos, presidente da UJS e um dos organizadores do protesto, justificou a falta de educação e democracia “Quem defende a democracia e não tolera 20, 30 jovens? Não tivemos direito ao microfone e tivemos de usar nossa voz”.  Pelas regras do evento, a plateia podia fazer perguntas por escrito para a cubana, como é praxe em eventos deste tipo, mas os radicais não se contentaram com isso e preferiram tumultuar o evento. (F S P, 22.02.2013, p. A-17)

RIO DE JANEIRO

Em 24 de fevereiro, Yoani Sánchez, no Rio de Janeiro, teve agenda de turista. Caminhou pela manhã pela orla da zona sul carioca, visitou o Forte de Copacabana, tomou água de coco em quiosque e conheceu o Pão de Açúcar.

Acompanhada pelo deputado federal Otavio Leite (PSDB/RJ), e por três seguranças cedidos pela Secretaria de Segurança do Estado ela tirou fotos com admiradores e foi recebida com beijos e abraços por onde passava e até ganhou um livro de Vinícius de Moraes dado por um fã.

Os manifestantes que a hostilizaram nas demais cidades misteriosamente sumiram. É um sinal de que os atos anteriores tiveram péssima repercussão e por isso foram interrompidos.

No alto do bondinho do Pão de Açúcar, até reclamou dizendo que estava sentindo a falta dos manifestantes. Apenas uma banhista em Copacabana gritou para que ela retornasse a seu país.

Cercada por jornalistas, cinegrafistas e fotógrafos, ela chamou a atenção por onde passou e na maioria das vezes era surpreendida por “parabéns”.

Afirmou “Levo comigo a pluralidade, a diversidade do Brasil e a solidariedade do brasileiro com o povo cubano”. (F S P, 25.02.2013, p. A-12).

O fato de Yoani ter passeado pelo Rio de Janeiro sem nenhum problema demonstra a realidade de que a população brasileira não tem a menor simpatia pelo regime cubano. Demonstra ainda que aqueles que a hostilizaram não passam de uma pequena minoria ideológica, que é barulhenta, mas inexpressiva no contexto da população.

CONTINUÍSMO NA DITADURA CUBANA

Por coincidência, durante a visita de Yoani ao Brasil foi escolhido o novo Chefe de Estado em Cuba e a escolha apenas confirmou que a ditadura cubana continua firme e forte.

Os 612 deputados do Partido Comunista, o único legal no país, foram chancelados nas urnas em fevereiro e votaram para escolher os integrantes do Conselho de Estado, a cúpula do Executivo.

Raul Castro surpreendeu jornalistas em 22 de fevereiro ao falar em renúncia: “Vou renunciar Já vou completar 82 anos. Tenho direito de me aposentar já. Não acreditam?” Aparentemente ele falou em tom de brincadeira. (F S P, 23.02.2013, p. A-14).

Era brincadeira mesmo. Em 24 de fevereiro Raul Castro, 81 anos, foi ratificado no poder por mais cinco anos e a única novidade é que anunciou que esse será seu último mandato. Na verdade esta afirmação também não é novidade nenhuma porque ele mesmo já havia proposto em 2011 que os cargos do Executivo se limitem a dois mandatos de cinco anos, até fevereiro de 2018. Outra limitação é a própria idade de 81 anos. “E ele vai governar até 86 anos e pelas suas próprias palavras é impossível que ele e os “históricos” sigam governando depois de 2018, pela” lei da vida”.

Reforçando ainda mais o caráter ditatorial do regime, foi escolhido um novo número dois do regime, Miguel Diaz-Canel, engenheiro elétrico, que seria seu provável sucessor, ou seja, Raul Castro decidiu que continua por mais cinco anos e já indicou quem vai ser o seu sucessor. A novidade é que Diaz Canel não lutou em Sierra Maestra e não é somente um  burocrata do partido. Foi secretário-geral do Partido, uma espécie de governador em Villa Clara e Holguin, e saiu-se bem nesses dois cargos. Dias-Canel substituiu José Ramón Machado Ventura, de 82 anos, um “histórico”, que chegou ao poder com a vitória guerrilheira em 1959.

Fora esta nova indicação, todos os demais cargos do Conselho de Estado foram ratificados, ou seja, a mudança é mínima.  A média de idade dos participantes da cúpula do governo é de mais de 70 anos.

O sistema cubano, além da centralização do poder e dos principais cargos nas mãos dos “históricos”, não tem aberto espaço a novos nomes e ao contrário, são frequentes os episódios de expurgos de lideranças mais jovens acusadas de “traição”.

Em 2009, o vice-presidente Carlos Lage, 61 anos e o chanceler Felipe Perez Roque, 47 anos foram retirados dos postos sob a acusação de traição.

O presidente da Assembleia, Ricardo Alarcón, 75 anos, que ficou no posto por 20 anos, foi substituído por Esteban Lazo, de 69 anos.

Raúl Castro discursou e deixou claro que as suas reformas econômicas liberalizantes são limitadas:” A mim não elegeram presidente para restaurar o capitalismo”. (F SP, 25.02.2013, p. A-12).

JOVEM PERIGOSA

Por que Yoani, com 37 anos, 55 quilos e 1,62 metro assusta tanto o regime cubano?  Ela comanda algum grupo guerrilheiro com o objetivo de derrubar a ditadura cubana? Não, ela é apenas uma jovem que escreve em blog que é censurado no país e que circula graças á colaboração de amigos no exterior. Pelo desespero do governo cubano com sua viagem ao exterior fica evidente o poder da palavra.

Com um computador velho e ajuda de voluntários que recebem seus textos por e-mail e os publicam traduzidos em vinte idiomas ela rompeu os controles, virou inimiga do regime e está incomodando o governo mais do que terroristas com armas e canhões.

Ela já foi sequestrada, torturada e acusada de praticar o mais grave dos crimes punidos pela ditadura cubana: defender a liberdade.

Yoani é mesmo um perigo pelo que fala. Churchill já havia alertado para os perigos do totalitarismo:” Os ditadores recorrem às medidas mais drásticas para evitar que as pessoas pensem por si sós. Um camundongo, um ratinho de nada de pensamento provoca pânico nos mais poderosos potentados”.  Yoani assim caracteriza o regime cubano “Venho de um Estado onde ter opinião é equivalente à traição”. (Revista Veja, 27.02.2013, p. 11).

Para ela o governo cubano e os castristas a temem porque “Eles temem a palavra, o argumento e o raciocínio lúcido dos que estão em Cuba são críticos do regime, ou tem alguma opinião diferente da do Partido Comunista. O governo simplesmente tem medo de que a comunidade internacional nos escute... Muita gente em outros países crê que o nosso povo é totalmente a favor do governo. Não somos todos comunistas. Não usamos farda verde-oliva. Se a comunidade interacional enxergar a pluralidade que existe entre nós, estaremos mais próximos da mudança... a propaganda estatal, de ataques aos Estados Unidos e ao imperialismo, criou um sentimento contrário ao esperado. A maioria dos jovens cubanos é fascinada pelos americanos. Eu até acho ruim esse enaltecimento de outro país, mas é uma realidade”. (Revista Veja, 27.02.2013, p. 58).

INTERNET SEM INTERNET

Em 2010 foi autorizada pelo governo a venda de CD piratas que foi incluída entre as 178 profissões autônomas permitidas pelo Estado: vendedor de discos compactos.

Desde então, tudo passou a ser vendido. Filmes estrangeiros e cubanos fora de circuito, séries americanas, telenovelas brasileiras ou no ar da TV estatal, programas de auditório nos canais de Miami, noticiário ou treggaetons “proibidões”, com letras ainda mais sexualmente explícitas do que o usual no ritmo que mistura reggae, hip hop, salsa e bachata.

Um CD pirata custa quase sempre o equivalente a R$ 2. Se for um programa mais difícil de encontrar pode sair pelo triplo.

No Malecón o grupo conta que a moda é comprar o “pacote da semana”, da TV a cabo, com brindes promocionais. Tudo capturado via “antenas” parabólicas clandestinas que captam as emissoras de Miami. É só o cliente ligar que com atraso de uma semana recebe em sua casa um disco rígido com a programação completa que permite passar para o computador ao preço de 5, 6 CUC [pesos cubanos conversíveis, algo entre R$ 10 e R$12].

Yoani Sanchez em sua passagem pelo Brasil declarou que “Depois de inventar o picadinho de carne sem carne, os cubanos inventaram a internet sem internet”. A rede off-line é complementada pelo envio coletivo de SMS para convocar para festas, por exemplo.

Os cubanos são cautelosos. Alexandre Solis afirma “Todo tipo de informação se repassa. Com dinheiro, você pode fazer tudo em Cuba. Mas ninguém quer se meter com a política”.

A conexão discada em Cuba, adquirida no mercado negro, que é muito lenta porque não há banda larga, custa de R$ 1,50 a R$ 4 por hora. Nos hotéis, a hora de conexão pode chegar a R$ 14, para um salário médio em Cuba de R$ 40.  Funcionários públicos que tem conexão melhor por serem administradores de rede, ganham a vida repassando conteúdo.

Ninguém tem endereço de e-mail, nem conta no Facebook, não acessam sites de vídeo na Internet por ser muito lenta, mas via Bluetooth, sem custo, sem rastro,  megabytes de vídeos, livros, música são repassados pelo celular. Outros elementos são pen-drives, cartões de memória e discos rígidos.

Em função do embargo norte-americano, a empresas que negociam com Cuba, o país jamais conseguiu se conectar a cabos de fibra ótica da Flórida ou de vizinhos caribenhos. A conexão é via satélite, meio mais caro. Em 2012 várias ferramentas do Google, como o Analytics, serviço gratuito de análise de páginas pela Internet foram proibidas em Cuba pela empresa que citou leis americanas como motivo para a restrição.

Em 2007 foi anunciada a construção de um cabo de fibra ótica ligando a Venezuela a Cuba, passando pela Jamaica, ao custo de R$ 144 milhões. Somente em 2012 o cabo entrou em operação, mas segundo a estatal Etecsa, empresa cubana de telefonia “A operação do cabo não significará que automaticamente se multipliquem as possibilidades de acesso. Será necessário executar investimentos na infraestrutura interna de telecomunicações e aumentar os recursos em divisas destinados a pagar o tráfego de internet”. (F S P, Ilustríssima, 3.3.2013, p 4).

Tomado de ADMINISTRADORES.COM.BR